7 de março de 2007

eu queria morrer

Ontem, à conversa com a Nhocas sobre toxicodependentes, lembrei-me de uma mulher que veio falar comigo no Porto, estava eu à espera de uma amiga na central de autocarros. Ela viu-me sozinha e aproximou-se. Disse: "Sabe, eu queria morrer." e todo o meu corpo doeu. Os meus olhos transbordaram e ela disse "Não chore..." enquanto também os seus olhos se encheram de lágrimas e se sentou ao meu lado. Já não tinha dentes nem saúde, nem carne nos ossos, nem pele sem manchas e feridas. Ela era toda dor. A voz saía baixinho e fiquei a ouvi-la. Queria voltar a drogar-se porque já não tinha força, queria morrer sem sofrer, por não ter quem cuidasse dela. Dei-lhe dinheiro para o autocarro mas acho que saiu dali para fazer outra viagem. Não me sinto culpada por isso. Sinto culpa sim, por lhe ter dado a mão naquele momento e depois ter ido à minha vida. Depois de ler qualquer coisa sobre as salas de chuto na Suíça e na Alemanha, começo a não lhes torcer o nariz.

3 comentários:

Anónimo disse...

Querida Natacha,
mais uma vez, a lágrima no cantinho do olho...
A única vez que falei com uma toxicodependente foi no CS de Darque. Perguntei-lhe delicadamente se tinha disponibilidade para responder a algumas perguntas e fui surpreendida por uma resposta tão violenta, que fiquei muda o resto do dia. Somos tentados a pensar que a nossa bata branca transmite confiança ao "outro", mas acontece precisamente o contrário, a maior parte das vezes.

Na verdade, eu só queria que ela olhasse para mim e visse uma rapariga de calças de ganga, t-shirt e sapatilhas, disposta a conversar. Não alguém vestido de branco, pronto para atirar uma crítica ou julgamento.

Um grande beijinho

nat. disse...

muito tocante...

beijinhos

Anónimo disse...

A toxicodependência é uma doença lixada, com a qual é muito complicado lidar. Só no teu post e no 1º comentário, temos duas vertentes distintas... As salas de injecção assistida (ou de chuto) não serão a solução para o problema, mas são umas das formas de lidar com ele, já que infelizmente existe (e sem as salas de chuto traz outros problemas ainda mais graves).

Só te queria dizer: não tens q te sentir culpada (não traficas, pois não?); nesse dia, que pode ter sido o último da vida dessa doente, deste-lhe um pouco de luz, e isso é sempre meritório.

Bj gde,

Ana M.