Longe da internet em geral, das minhas coisas em particular. Mas estou bem e mando beijinhos a quem me lê.
Dói-me o lado esquerdo do corpo. Porque ontem os cães atacaram um gato e eu sozinha com eles. Gritar não valeu de nada. Agarrar a boxer só com uma mão enquanto tentava tirar o outro de cima do gato também não. Agora tenho dores no corpo e a imagem na cabeça. E os sons. Quis ser surda.
Agora tenho dores do lado esquerdo do corpo.
Vou voltar à rotina. Mas antes disso vou pôr um desenho aqui para vos mostrar.
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9 de dezembro de 2008
11 de julho de 2008
projectos atrasados II

Já várias vezes disse aqui que quando criei este blog não imaginava o que aí viria. E de tudo o que ele me tem trazido, o melhor é a surpresa de encontrar pessoas maravilhosas. Pessoas que decidem expor-se também, desinteressadamente. Pessoas que me acarinham com comentários ou emails e a quem me afeiçoo com o passar do tempo. Acabamos por trocar pedacinhos das nossas vidas e a barreira entre o virtual e o real vai-se tornando cada vez mais frágil.
Foi assim com a Conceição. E esta encomenda que ela me fez, em pouco tempo tornou-se pessoal para mim e aqueceu-me o coração.
Esta pinturinha conta a história duma linda bisavó que um dia foi para o céu, deixando cá em baixo dois bisnetos ainda pequeninos e a quem seria difícil consolar a dor da perda. Quando foi dito à bisneta mais velha que a Bisavó morava agora numa estrelinha, ela afirmou que então iria buscá-la numa casa voadora. Esta ideia e o bolo de chocolate foram o mote. E porque no céu só há coisas boas, construímos devagarinho esta pintura, à base de muito mimo, asas de anjo, pirilampos, flores, e até a visita do elemento canino da família. Eu chorei com a Conceição a perda da sua mãe e tive o privilégio de tentar materializar a ternura que ela me descreveu com palavras em cada email. Muito muito obrigada, querida.




24 de maio de 2008
post antigo
Ao fundo do corredor havia luz. Números de capelas e azulejos. Entrei com a minha mãe e havia tanta gente, apesar de já ser de noite e tarde. Nunca tinha ido a um velório. O caixão pareceu-me pequeno e não consegui imaginar ninguém lá dentro. Eu acredito que o espírito voa, livre. Foi então que olhei para ela, para os olhos dela. O meu coração começou a saltar como se vivesse sozinho dentro das minhas costelas, sem órgãos vizinhos. Não me saiu uma palavra da boca. O que dizer? Só me apetecia chorar muito. Não há dor como a da alma. Não há. Senti-me ridícula na minha crise existencial de quem está só exausto de tanto pensar em coisas parvas.
Bem leve leve, releve,
Quem pouse a pele em cima de madeira
Beira beira, quem dera, mera mera, cadeira
Bem leve leve, releve,
Quem pouse a pele em cima de madeira
Beira beira, quem dera, mera mera, cadeira
10 de março de 2008
memórias palpáveis
O ser humano é aquele animalzinho que tem pêlo onde não é preciso e se apega aos objectos. Pega neles e acumula-os no seu ninho. Não para se alimentar nem se aquecer. Guarda-os, simplesmente. Dizem que os objectos fazem bem ao coração deste pequeno mamífero.


Eu sou muito humana, pobre de mim. Apego-me à vida dos objectos, à memória que eles transportam. Acumulo lixo, na prática é só isso.
Estes sacos trazem pedacinhos de vida. Vida dum cão que viveu 13 anos, que se tornou parte da família e que usava a sua inteligência para alcançar e comer às escondidas todos os alimentos proibidos.
O tecido velho e roçado, tão anos 80 e já com metade da cor original, foi onde a Boxi passou muitas horas deitada, nas férias em Afife, com os seus tumores gigantescos pendurados por todo o corpo. A Boxi morreu e foi para o céu comer todo o chocolate que não pôde comer em vida. O tecido ficou e não é justo dar-lhe outro uso. Tirar-lhe a memória da Boxi, tão cheia de sentido de humor e meiguice, mesmo quando já estava a ser consumida por um cancro.
Pedi o tecido à minha Teia para fazer um saco para mim. Mas estes dois são para ela e para a mi primi. Nem me interessa se é macabro ou fashion. Aquece-me o coração.
Quando desfiz a bainha ao tecido encontrei pêlos intactos que sobreviveram às lavagens. Pedacinhos da Boxi. Até o cheiro dela voltou quando o passei a ferro.
Ilustração: eu na máquina de costura, o tecido, os sacos e a minha lamechice toda. E por cima de mim a Boxi-cachorrinho, com asas de anjinho e a rir-se deste meu ateísmo-espírita-pateta, a coser pedacinhos de quotidiano, quando o que realmente importa é comer porcarias.
Feliz aniversário mi primi. Parabéns Teia quereida. Os sacos chegam aí amanhã. Muitos beijos repenicadinhos.


Eu sou muito humana, pobre de mim. Apego-me à vida dos objectos, à memória que eles transportam. Acumulo lixo, na prática é só isso.
Estes sacos trazem pedacinhos de vida. Vida dum cão que viveu 13 anos, que se tornou parte da família e que usava a sua inteligência para alcançar e comer às escondidas todos os alimentos proibidos.
O tecido velho e roçado, tão anos 80 e já com metade da cor original, foi onde a Boxi passou muitas horas deitada, nas férias em Afife, com os seus tumores gigantescos pendurados por todo o corpo. A Boxi morreu e foi para o céu comer todo o chocolate que não pôde comer em vida. O tecido ficou e não é justo dar-lhe outro uso. Tirar-lhe a memória da Boxi, tão cheia de sentido de humor e meiguice, mesmo quando já estava a ser consumida por um cancro.
Pedi o tecido à minha Teia para fazer um saco para mim. Mas estes dois são para ela e para a mi primi. Nem me interessa se é macabro ou fashion. Aquece-me o coração.
Quando desfiz a bainha ao tecido encontrei pêlos intactos que sobreviveram às lavagens. Pedacinhos da Boxi. Até o cheiro dela voltou quando o passei a ferro.
Ilustração: eu na máquina de costura, o tecido, os sacos e a minha lamechice toda. E por cima de mim a Boxi-cachorrinho, com asas de anjinho e a rir-se deste meu ateísmo-espírita-pateta, a coser pedacinhos de quotidiano, quando o que realmente importa é comer porcarias.
Feliz aniversário mi primi. Parabéns Teia quereida. Os sacos chegam aí amanhã. Muitos beijos repenicadinhos.
19 de junho de 2007
voa patim

O meu Patim. Histórias dele.
Quando a Joana* morreu eu saí do veterinário ainda de olhos inchados e disse: "Se não fosse vegetariana ia ali ao hipermercado e comprava outro coelho.". É demasiado irónico estarmos a lutar pela vida de uma coelha albina enquanto do outro lado da rua se vendem dezenas de coelhas albinas esfoladas e embrulhadas em celofane. Pensei se a Dra. chegaria a casa e comeria coelho ao jantar...
Apesar de todas as coisas desagradáveis que tenho ouvido ao longo dos tempos por achar que a vida animal merece todo o nosso respeito, não posso deixar de dizer o que penso.
Depois de ver um pato e um coelho brincarem, mimarem-se e dormirem encostados um ao outro, tenho a certeza absoluta de que nós humanos, enquanto espécie superior, ainda temos muito que lutar para tirar os olhos dos nossos umbigos. Não há arroz de pato que valha um Patim numa fábrica. Não há rimel que valha uma Joana a ser torturada em laboratório. Não há casamento que valha um leitãozinho morto. E por aí fora...
15 de junho de 2007
poder morrer
"A Suíça é o único país do mundo em que associações como a que dá título a este filme existem para prestar assistência aos doentes que, para não prolongar uma dolorosa agonia, pretendem pôr fim às suas vidas. Há mais de vinte anos que equipas de voluntários acompanham doentes crónicos e portadores de deficiências graves em direcção a uma saída que consideram mais digna. Neste documentário acompanhamos todos os passos de um processo longo e delicado, em que uns e outros enfrentam a morte. Não como um tabu, nem com um fim inaceitável, mas como uma libertação. Numa sociedade que tende a tudo controlar, eles colocam uma questão de ordem íntima: escolher a forma como se quer morrer não será a última manifestação de liberdade que lhes é concedida?"
EXIT - O DIREITO DE MORRER (hoje às 23h30 na RTP2)
Quando (em 1998) vi o Ramon Sampedro beber o cianeto eu fiquei marcada para o resto da minha vida. Desde esse dia que sou totalmente a favor da eutanásia (o "Mar Adentro" é um dos filmes da minha vida).
É por ser tão apaixonada pela Vida e por poder viver a minha vida como desejo que só posso sentir um enorme respeito por quem (pelas suas razões) quer morrer. Acho que o facto de vermos a morte dos outros como nosso sofrimento não pode ser motivo para os impedirmos de pôr termo à vida.
Uma vez vi um documentário sobre a eutanásia e como esta é aplicada em diferentes países. Penso que era na Suíça que permitiam a crianças doentes em estado terminal (internadas) decidir quando morrer. Era-lhes dado um comprimido e a possibilidade de o tomar assim que sentissem que estava na hora. Aquilo comoveu-me tanto. O médico dizia que elas sentiam exactamente quando devia ser.
Sei que este tema é demasiado polémico. Este é só o meu ponto de vista. Sou pela vida própria, pela dignidade, pelo respeito pela individualidade e pela liberdade de escolha. É também por estes motivos que sou contra a pena de morte. Mas sou, definitivamente, a favor da eutanásia.
Já sei que hoje vou chorar.
EXIT - O DIREITO DE MORRER (hoje às 23h30 na RTP2)
Quando (em 1998) vi o Ramon Sampedro beber o cianeto eu fiquei marcada para o resto da minha vida. Desde esse dia que sou totalmente a favor da eutanásia (o "Mar Adentro" é um dos filmes da minha vida).
É por ser tão apaixonada pela Vida e por poder viver a minha vida como desejo que só posso sentir um enorme respeito por quem (pelas suas razões) quer morrer. Acho que o facto de vermos a morte dos outros como nosso sofrimento não pode ser motivo para os impedirmos de pôr termo à vida.
Uma vez vi um documentário sobre a eutanásia e como esta é aplicada em diferentes países. Penso que era na Suíça que permitiam a crianças doentes em estado terminal (internadas) decidir quando morrer. Era-lhes dado um comprimido e a possibilidade de o tomar assim que sentissem que estava na hora. Aquilo comoveu-me tanto. O médico dizia que elas sentiam exactamente quando devia ser.
Sei que este tema é demasiado polémico. Este é só o meu ponto de vista. Sou pela vida própria, pela dignidade, pelo respeito pela individualidade e pela liberdade de escolha. É também por estes motivos que sou contra a pena de morte. Mas sou, definitivamente, a favor da eutanásia.
Já sei que hoje vou chorar.
30 de maio de 2007
melrinho voa voa
Ontem o Matias matou um melro bebé. Eu encontrei-o ainda a contorcer-se no chão molhado da chuva e fiquei com tanta pena. Fui buscar um pano, enrolei-o e tentei aquecê-lo para que a sua morte fosse um pouco menos triste. Depois, porque não sou muito boa nestas coisas, chamei o Anjinho.
Anjinho das coisas perdidas, por favor leva este bebé de volta para a sua mãe.
Eu senti vontade de chorar mas o Anjinho não é assim. É optimista e acredita que todos os seres vão para o céu. Colocou a mão sobre o coração do melro, aqueceu-o com o seu amor e sussurrou:
"Melrinho, melrinho, melrinho bebé
Morre devagarinho que eu estou aqui ao pé
Melrinho, melrinho, melrinho querido
Abre as tuas asas e vem voar comigo."

Assim que deixaram o corpo do Melrinho para trás, foram ver a sua mãe. Deram-lhe muitos beijinhos sem ela saber e ficaram abraçados a ela muito tempo, até que ela adormeceu sossegada. Depois voaram em direcção ao céu e já nem os gatos nem a chuva podiam parar o Melrinho.
Anjinho das coisas perdidas, por favor leva este bebé de volta para a sua mãe.
Eu senti vontade de chorar mas o Anjinho não é assim. É optimista e acredita que todos os seres vão para o céu. Colocou a mão sobre o coração do melro, aqueceu-o com o seu amor e sussurrou:
"Melrinho, melrinho, melrinho bebé
Morre devagarinho que eu estou aqui ao pé
Melrinho, melrinho, melrinho querido
Abre as tuas asas e vem voar comigo."

Assim que deixaram o corpo do Melrinho para trás, foram ver a sua mãe. Deram-lhe muitos beijinhos sem ela saber e ficaram abraçados a ela muito tempo, até que ela adormeceu sossegada. Depois voaram em direcção ao céu e já nem os gatos nem a chuva podiam parar o Melrinho.
15 de maio de 2007
quando um gato chora
Na rua dos meus pais passam carros em excesso de velocidade. Gato atropelado tornou-se prato do ano e eu comecei a formar uma carapaça à prova da dor de ver mais um morto na estrada.
A vida de gato é essa liberdade de ir onde quiser, dormir fora, apanhar sol na varanda da casa da vizinha. E se um gato volta para casa, se deita na nossa cama e nos cobre de turras e ronrons, é porque quer mesmo estar connosco. Surpreendentemente para os que odeiam gatos ao ponto de nem os poder ver, os gatos amam. Amam profundamente. Amam os seus donos e no caso desta história, amam os seus irmãos.
A minha mãe comprou o Batman e o Robin na feira. Nem me vou pronunciar em relação à escolha dos nomes.
Os gatinhos cresceram juntos tentando sobreviver à fome da Gioconda e ao amor desmesurado da Boni por bebés. Ela queria lambê-los (e lambia!) e carregá-los pelo cachaço. A Gi ficava de olho, cúmplice do Peter nas ciladas.
Para ajudar os gatinhos a escapar aos cães, ensinei-os a saltar (fazendo-os voar com a mão do chão para cima da mesa) e a trepar ao seu poleiro e às árvores, em treinos intensivos.

Em pouco tempo os dois gatinhos ficaram enormes. Especialistas em trepar às árvores e em caçar qualquer coisa que mexesse. Os cães deixaram de ser uma ameaça e a vida de gato corria bem. Apenas pairava sobre eles a maldição da estrada.
Estava eu no hipermercado com o Bruno quando a Cilu telefonou. Voámos para a frente de casa. Ali estava o corpo. Para trás um rasto de sangue e nem sinal de o carro ter parado. A minha dúvida sobre se seria um dos nossos gatos (o corpo estava tão gordo...) desvaneceu-se quando a poucos metros vi o outro a olhar para nós. E dali não saiu até que nos fossemos embora e ele pudesse ficar a sós com as marcas na estrada e com a sua mágoa.
Dentro do Robinho nasceu uma dor que não se apaga. A memória do atropelamento, do rasto na estrada que ele farejou centímetro a centímetro quando nos fomos embora, do irmão nas minhas mãos e da noite que passou sozinho. Quando está mais triste e ninguém vê, chora muito. O seu focinho cobriu-se de pêlos escuros. Não aceita o meu colo e arranha-me se eu o forçar. Nunca mais lhe ouvi o ronrom. O seu mio mudou, a sua postura... Decidimos trazer-lhe o um gatinho.

O Matias era doente e muito fraco. Mas falou logo com o Robinho.
"Olá. Queres brincar? Eu vim de Perre, a minha mãe perdeu-se de mim... Queres brincar?"
O Robin detestou o Matias. Deu-lhe desprezo. Mas o Matias não desistiu. Muitas foram as vezes em que se aproximou já de orelhas recolhidas, pronto para levar uma unhada na cabeça. O Matias precisava desesperadamente de alguém. Precisava de continuar a acreditar que a mãe não o tinha abandonado. O Robin rosnava, batia e afastava-se com a sua dor. Chegou a persegui-lo até o Matias se esconder em recantos muito estreitos, a salvo das suas garras. Um dia vi-o a falar com ele. Estava sentado em cima do muro. O muro tinha apenas 1 metro de altura mas do outro lado tinha 3 metros. Sabendo que o Matias ainda era um bebé e que nunca tinha saltado, o Robin aproveitou.
"Matias: Que estás a fazer aí?
Robin: Estou a apanhar sol. Consegues subir para aqui?"
Era a oportunidade de o Matias conquistar a sua confiança.
"Matias: Sim!
Robin: Quero ver."
Felizmente eu cheguei a tempo de dar uma ajuda ao Matias e de o colocar em cima do muro. Mas o Robin continuou a mostrar-lhe como era a vida de gato, levando-o para a beira da estrada para verem os carros passar.
"Matias: São rápidos! E grandes. Fazem tanto barulho....
Robin: Sim.
Matias: Podemos ir embora?
Robin: Porquê? Tens medo?
Matias: Não!"

Um dia o Matias apanhou o Robin a dormir e começou a lambê-lo. O Robin acordou mas não abriu os olhos. Recordou-se imediatamente de quando dormia com o irmão, das suas lutas felinas incríveis e de como se lavavam juntos. O Robin começou a chorar mas o Matias fez de conta que não viu. E foi assim que ficaram amigos.
A vida de gato é essa liberdade de ir onde quiser, dormir fora, apanhar sol na varanda da casa da vizinha. E se um gato volta para casa, se deita na nossa cama e nos cobre de turras e ronrons, é porque quer mesmo estar connosco. Surpreendentemente para os que odeiam gatos ao ponto de nem os poder ver, os gatos amam. Amam profundamente. Amam os seus donos e no caso desta história, amam os seus irmãos.
A minha mãe comprou o Batman e o Robin na feira. Nem me vou pronunciar em relação à escolha dos nomes.
Os gatinhos cresceram juntos tentando sobreviver à fome da Gioconda e ao amor desmesurado da Boni por bebés. Ela queria lambê-los (e lambia!) e carregá-los pelo cachaço. A Gi ficava de olho, cúmplice do Peter nas ciladas.
Para ajudar os gatinhos a escapar aos cães, ensinei-os a saltar (fazendo-os voar com a mão do chão para cima da mesa) e a trepar ao seu poleiro e às árvores, em treinos intensivos.

Em pouco tempo os dois gatinhos ficaram enormes. Especialistas em trepar às árvores e em caçar qualquer coisa que mexesse. Os cães deixaram de ser uma ameaça e a vida de gato corria bem. Apenas pairava sobre eles a maldição da estrada.
Estava eu no hipermercado com o Bruno quando a Cilu telefonou. Voámos para a frente de casa. Ali estava o corpo. Para trás um rasto de sangue e nem sinal de o carro ter parado. A minha dúvida sobre se seria um dos nossos gatos (o corpo estava tão gordo...) desvaneceu-se quando a poucos metros vi o outro a olhar para nós. E dali não saiu até que nos fossemos embora e ele pudesse ficar a sós com as marcas na estrada e com a sua mágoa.
Dentro do Robinho nasceu uma dor que não se apaga. A memória do atropelamento, do rasto na estrada que ele farejou centímetro a centímetro quando nos fomos embora, do irmão nas minhas mãos e da noite que passou sozinho. Quando está mais triste e ninguém vê, chora muito. O seu focinho cobriu-se de pêlos escuros. Não aceita o meu colo e arranha-me se eu o forçar. Nunca mais lhe ouvi o ronrom. O seu mio mudou, a sua postura... Decidimos trazer-lhe o um gatinho.

O Matias era doente e muito fraco. Mas falou logo com o Robinho.
"Olá. Queres brincar? Eu vim de Perre, a minha mãe perdeu-se de mim... Queres brincar?"
O Robin detestou o Matias. Deu-lhe desprezo. Mas o Matias não desistiu. Muitas foram as vezes em que se aproximou já de orelhas recolhidas, pronto para levar uma unhada na cabeça. O Matias precisava desesperadamente de alguém. Precisava de continuar a acreditar que a mãe não o tinha abandonado. O Robin rosnava, batia e afastava-se com a sua dor. Chegou a persegui-lo até o Matias se esconder em recantos muito estreitos, a salvo das suas garras. Um dia vi-o a falar com ele. Estava sentado em cima do muro. O muro tinha apenas 1 metro de altura mas do outro lado tinha 3 metros. Sabendo que o Matias ainda era um bebé e que nunca tinha saltado, o Robin aproveitou.
"Matias: Que estás a fazer aí?
Robin: Estou a apanhar sol. Consegues subir para aqui?"
Era a oportunidade de o Matias conquistar a sua confiança.
"Matias: Sim!
Robin: Quero ver."
Felizmente eu cheguei a tempo de dar uma ajuda ao Matias e de o colocar em cima do muro. Mas o Robin continuou a mostrar-lhe como era a vida de gato, levando-o para a beira da estrada para verem os carros passar.
"Matias: São rápidos! E grandes. Fazem tanto barulho....
Robin: Sim.
Matias: Podemos ir embora?
Robin: Porquê? Tens medo?
Matias: Não!"

Um dia o Matias apanhou o Robin a dormir e começou a lambê-lo. O Robin acordou mas não abriu os olhos. Recordou-se imediatamente de quando dormia com o irmão, das suas lutas felinas incríveis e de como se lavavam juntos. O Robin começou a chorar mas o Matias fez de conta que não viu. E foi assim que ficaram amigos.
29 de março de 2007
um dia não são dias

Restavam poucos dias de vida ao meu cão. Como já nem queria comer, a veterinária quis pô-lo a soro. Mas porquê soro? Porquê ficar internado? Depois de me ver lavada em lágrimas, a Dra. decidiu deixar-me levar o Dunga. "Vamos para casa. Vamos."
Ele cambaleava à chuva, cheirou os carros um por um e parou ao pé do nosso. Cheguei a ter de carregá-lo ao colo, pesava 30 kg.
Já que nos restava pouco tempo, achei que não "faria mal" à educação do Dunga deixá-lo dormir comigo e subir para o sofá...
Morreu tal como eu queria, na minha cama, o lugar mais cobiçado e onde adorava dar cambalhotas. O meu cão mau. Coberto de beijos, de olhos postos em mim.
22 de março de 2007
joaninha voa voa

"JB - A Duana?
Bruno - A Joana ficou doente e morreu...
JB - Para onde foi?
Bruno - Foi... para o céu.
JB - E voou?"
É claro que eu fiz o filme todo. A Joana sofreu muito antes de morrer. Chorou muito como eu nunca imaginei que um coelho pudesse chorar. Morreu ao pé da Binhas e felizmente ela fez-lhe festinhas antes de a coelha-mais-bem-humorada-e-tarada -sexual-que-eu-conheci fazer o seu voo para as estrelas.
Já no céu, a Joana reparou que havia poucos coelhos iguais a ela. Da mesma cor havia muitos. Com olhos vermelhos também. Mas poucos coelhos tinham vivido em casa, com um pato muito meigo, alguns cães para perseguir e muita alface dada pela mão de um menino de 3 anos. A Joana viu que muitos coelhos, quando olhavam lá para baixo, viam os seus corpos já sem pêlo, embalados em celofane, outros cobertos de rímel para os olhos e protector solar, e muitos muitos muitos, em fábricas, esfolados e abandonados para dar lugar a casacos, luvas e botas muito chiques. A Joana nem era dada a lamechices, mas quando perguntou a um coelhinho como se chamava e ele começou a chorar, abraçou-o muito e disse: "Queres vir voar comigo? Eu dou-te a mão."
7 de março de 2007
eu queria morrer
Ontem, à conversa com a Nhocas sobre toxicodependentes, lembrei-me de uma mulher que veio falar comigo no Porto, estava eu à espera de uma amiga na central de autocarros. Ela viu-me sozinha e aproximou-se. Disse: "Sabe, eu queria morrer." e todo o meu corpo doeu. Os meus olhos transbordaram e ela disse "Não chore..." enquanto também os seus olhos se encheram de lágrimas e se sentou ao meu lado. Já não tinha dentes nem saúde, nem carne nos ossos, nem pele sem manchas e feridas. Ela era toda dor. A voz saía baixinho e fiquei a ouvi-la. Queria voltar a drogar-se porque já não tinha força, queria morrer sem sofrer, por não ter quem cuidasse dela. Dei-lhe dinheiro para o autocarro mas acho que saiu dali para fazer outra viagem. Não me sinto culpada por isso. Sinto culpa sim, por lhe ter dado a mão naquele momento e depois ter ido à minha vida. Depois de ler qualquer coisa sobre as salas de chuto na Suíça e na Alemanha, começo a não lhes torcer o nariz.
6 de fevereiro de 2007
14 de janeiro de 2007
Casa vazia
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