3 de junho de 2015

um ano e nove meses

Vinte e um meses, hoje.
Perco a paciência e levanto a voz (às vezes grito, raramente, mas grito) mais vezes do que queria. Culpo o facto de estarmos juntos vinte e quatro horas por dia há 21 meses. Às vezes dava-me muito jeito ter alguém com deixar o Dioguinho nem que fosse por uma hora, para o bem de ambos. De resto, fascina-me isto de ser mãe e de ver de perto um bebé tornar-se gente. Não trocava o que tenho por nada. Só pelo mesmo com um pouco de babysitting.

Não é correcto chamar filhos da puta aos dentes do meu filho, mas é isso que lhes chamo. Desde que começou esta coisa rara (pelos vistos é raro sofrer-se tanto como o Diogo sofre com a vinda dos dentes) que as nossas noites sossegadas passaram a um número de circo executado por dois adultos exaustos e um bebé desesperado de dores, entre uma cama de casal e um berço, uma mama de fora, ou as duas e - rufam os tambores - respeitável público, até à data, ninguém caiu ao chão!
Como dizia, os molares do meu filho estão a caminho. No dia em que ele tiver todos vinte dentinhos de fora, faço a festa que não fiz no aniversário de um ano.

Não sabe o que é bolacha maria. Nem comida processada. Quer sempre provar o que eu estou a comer. Come quando quer, o quanto quiser, de maneira que quando tem fome, come como um adulto. E graças aos dentes de que tanto me queixo, come coisas que nunca pensei que gostaria, como uvas passas, tâmaras, bagas goji e figos secos. São as guloseimas dele. Continua a adorar bróculos e legumes em geral. Um dia quis provar salada e até eu fiquei pasma quando pediu para repetir. Era couve roxa, aipo, cebola, cenoura, salsa... tudo marcha. E não engorda. Abacate com outras frutas, batidos e papas com leite de amêndoa e sementes de chia, sumo verde cheio de couve, pepino, salsa e coentros. Uma coisa boa de ser ver. A não ser que estejam para vir os dentes, claro. Aí quer é o xarope para as dores e mamar de hora em hora. E morder todo e qualquer objecto.

Já várias vezes achei que ia enlouquecer. Mas a Natureza é sábia e dotou-nos duma amnésia selectiva muito eficaz. A mesma que nos faz desejar parir outro filho quando ainda nem os pontos levámos.

Fala e faz-se entender tão bem. Só começou a apontar com o dedo indicador há pouco mais de um mês. Tem amigos em todas as lojas que frequentamos no bairro. Pessoas favoritas de quem sabe e diz os nomes e repete-os vezes e vezes sem conta, a pedir-nos que o levemos até elas. Conhece as rotinas, os caminhos, as portas das lojas e do nosso prédio sem hesitação. Percebe tudo o que dizemos, sabe o que pode e não pode fazer. Faz o que não pode e vem confessar-se a dizer né né né. Também diz iá num tom tão holandês que chega a ser cómico. Sempre que vê passar um avião diz "avi" e recentemente descobriu a lua.
Dança. Canta. Finge que espirra. É loucamente apaixonado pelos avós. Não faz daquelas birras típicas (ainda) mas quando é contrariado é capaz de nos morder ou bater. Depois diz né né né.
Não sei o que seriam os momentos difíceis de não tivesse este livro.

Como precisávamos dum degrau para chegar à pia, comprámos um conjunto que já traz potinho e assento para a sanita. Deixámos o potinho aqui na sala, para ele já se ir familiarizando e sentando. Em vez disso, finge que cozinha - potinho debaixo do braço, colher a mexer vigorosamente, prova a comida imaginária e a delicia-se com huuuuuuuuuuums estridentes. E se olharmos duas vezes pergunta-nos se somos servidos.

Damos beijinhos à esquimó. Digo-lhe ao ouvido "amo-te tanto tanto tanto tanto" e peço-lhe que me diga também. Sussurra "titititi".

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