Quando olho para o meu filho a caminhar no parque e me vejo a orientá-lo, me ouço a dizer "vamos" mais vezes do que desejo e a impedi-lo de largar a correr relva fora, desviando-se do caminho, não consigo não sentir tristeza. Todos os dias desejo que seja adiado o dia em que o espírito selvagem do Diogo seja ferido, e enquanto isso sou eu quem já o vai domando.
Lá íamos, à volta do lago, ele a fazer pausas para apanhar algo do chão, ou mexer numa planta, ou cumprimentar alguém, ou se agachar e esfregar o chão de terra batida cheio de pedrinhas. Fica com as palmas cinzentas, apanha um grão que lá lhe saltou ao tacto e traz-mo. Deixar que se suje à vontade e meta as mãos na boca são tarefas fáceis, comparadas com conter o apressar quando na verdade não há pressa nenhuma, deixá-lo parar quantas vezes quiser. A minha intenção de o "treinar" no parque para que um dia possa andar no passeio sabendo que a estrada é perigosa até pode ser muito boa, mas o que se torna óbvio para mim é a minha ansiedade quase crónica, a necessidade de controlo, o impulso de o proteger e sobretudo a formatação que sofri ao longo desta minha vida, e que por mais que não queira, teimo em já impor ao meu bebé.
Lá estava ele, agachado, tão pequenino, tão frágil no meio da imensidão do parque. Olhei e contive o "vamos?", vi-o a ele e a um plátano centenário, e o meu bebé era feito do mesmo que tudo o resto. Tinha nele a mesma sabedoria centenária do simplesmente existir no momento presente, de tocar no chão e nas pedrinhas porque o chão e as pedrinhas estão ali, o caminho e o relvado formam uma mesma superfície sem limites, e o ir para casa ou ver os patos não existem ainda. Para ele tudo é possilidades, tudo é permitido até que eu lhe diga que não, tudo é limpo e puro até que eu lhe diga que é sujo, tudo é trepável até que eu o avise que pode cair. Parece que à medida que lhe vou roubando esta visão inocente e animal da energia que gere a Terra, transfiro para ele e preencho esses vazios com os meus medos, as minhas regras, os meus limites e limitações. E parece-me tudo tão cruel e injusto, porque na verdade ele é o meu professor, quando volta a agachar-se sem pressa para apanhar mais uma pedrinha.
22 de abril de 2015
18 de abril de 2015
doem-me as costas até aos pés
As palavras acumulam-se-me na garganta, e volta e meia transbordam em forma de post.
Tenho umas saudades de trabalhar que às vezes dá-me vontade de chorar. Trabalhar no sentido de ir para o trabalho, fazer cafés (as saudades que tenho de fazer flat whites e desenhar coraçõezinhos com a espuma do leite chegam a ser doentias), clientes e colegas com quem conversar sobre nada de muito profundo, ter horas marcadas e intervalos e metros à pinha para regressar a casa. Porque trabalhar assim parece férias, comparado com ser mãe a tempo inteiro.
Há uns meses vi a minha vizinha de baixo sair para o trabalho uns quantos dias seguidos. Acho que ao terceiro dia senti inveja. Isto só faz sentido para quem tem filhos, imagino. Essa saudade da vida passada, dos tempos em que eu era só eu, tão mas tão livre que nem tinha noção do mundo de possibilidades que tinha nas mãos. Perguntem-me se queria voltar atrás, ou ter adiado o ter um filho, se me arrependo do que quer que seja e a resposta é não, não, não. Não há como imaginar a vida sem o Diogo. A vida é tão melhor com um filho que até o nosso passado parece mais feliz. Parece que as saudades me toldam a razão e só me lembro de coisas boas. As viagens com o Faneca. Vejo-me em esplanadas a tomar cafés, a comer azeitonas e a beber vinho, vejo fins de tarde rodeada de amigos e gargalhadas, e todos esses dias me parecem Verão. Tudo me parece morno e vejo-me com a minha prima no mar de Carreço a nadar, vejo-me deitada na areia a observar conchas tão pequenas que pareciam grãos de areia também... de cores que nunca imaginei. Cansaço? Sabia lá eu o que era cansaço. Frustração? Sabia lá eu. Não dormir bem uma noite? UMA NOITE? Ahahahhahahhahaha!
A minha vizinha um dia voltou do trabalho e encontrámo-nos lá em baixo, eu a tentar domar a minha cria, o carrinho, as bolachas, gorros, cachecóis, toalhitas e fraldas. Ela toda livre, toda só ela, chave de casa na mão, bolsa ao ombro, quando me diz "I'm expecting" e mostra-me o crachá "baby on board". E foi como se me tivesse dito que tinha ganho a lotaria. Melhor, que eu tinha ganho a lotaria! Arrepiei-me toda, agradeci-lhe tanto por me contar, vim para casa e fui buscar dois dos meus livros sobre gravidez e bebés, pus-lhes um grande laço vermelho. A vida da minha vizinha já podia ser boa, mas o melhor está para vir, não tenho dúvidas.
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