Foi num programa chamado what not to wear que ouvi isto, esta frase que me ficou gravada e que ecoa até hoje na minha mente. A mulher que não gostava do próprio corpo e que por isso não se "vestia bem", e o apresentador que lhe dizia qualquer coisa como "o teu corpo é uma máquina de vida que trabalha para se manter bem e saudável, devias amá-lo pelo que ele é." Desde daí que vejo o meu corpo com outros olhos. Este corpo que eu já tanto maltratei, que odiei na minha adolescência, este corpo a que família, amigos e estranhos chamaram gordo quando eu não sabia como reagir, este corpo que dá abrigo à minha mente, às vezes mais, às vezes menos perturbada. Nunca me falhou, este corpo. Foi há poucos anos que tive esta espécie de epifania. Que este é o único corpo que terei na vida, saudável e tão forte apesar de tudo, sempre a regenerar-se, sempre. Foi mais do que uma reconciliação, foi como apaixonar-me pela máquina de vida que sou.
Quando engravidei já estava em estado de graça. E no dia (grávida de poucas semanas) em que vi as minhas mamas mudarem de forma e de cor soube que de nada valeria resistir ao poder da mãe natureza. Rendi-me. Encarreguei-me apenas de me manter feliz e fazer uma dieta o mais saudável possível. Sempre tive a certeza de que o mais importante era manter-me cheia de amor e gratidão e desejar que a natureza fosse generosa comigo. Sou um animal, dizia a mim mesma. Sou um animal como qualquer outro e há uma força superior a mim a governar o meu corpo neste momento. Durante os nove meses este foi o meu mantra. Além disso houve vários momentos chave que me prepararam para o parto. Coisas que ouvi ou li e que fui arquivando na minha mente, para que nunca fosse ela a apoderar-se do meu corpo, e sim o contrário. A namorada dum amigo contar-me que a mãe se preparou sozinha com uma cassete de hipnoparto e não usou drogas. O Stephen Fry no QI a dizer que a percepção da dor depende da ansiedade que se sente e a tensão que pomos no nosso corpo. A minha avó, a minha mãe e a minha tia terem tido os seus filhos de parto normal focadas na ideia de que a dor terminaria com um bebé nos seus braços. A aula de yoga que fazia no youtube em que a dor era referida como um sinal de que tudo estará a funcionar bem e que as contracções são o meu corpo a abraçar e empurrar o meu filho até que ele se encontre comigo cá fora. Li muito. Li tudo o que me apareceu e vi muitos, muitos videos. Mentalizei-me de que o parto é algo imprevisível e que tanta coisa pode correr mal, mas só imaginaria o meu a correr na perfeição, o mais natural e livre de químicos possível. Decidi que passaria pouco tempo na cama, que usaria a Gravidade para acelerar as coisas, que manteria as pernas fortes e ágeis para passar horas a pé. Trabalhei até ao final do oitavo mês, rodeada de pessoas a dizerem-me que descansasse, que me sentasse. Só o Faneca é que sempre me deixou fazer o que quisesse. E eu só parava quando o inchaço dos pés já chegava às coxas. No fim já tinha mais de 13 quilos em cima e o meu corpo continuava a pedir acção. Costurei como uma louca, arrastei móveis, montei a nossa cama nova sozinha. Enquanto o meu corpo me pediu para me mexer, eu mexi-me. Há qualquer coisa de primário, de tão animal e tão instintivo na gravidez. Dar ouvidos ao meu corpo foi o melhor que eu podia ter feito.
27 de setembro de 2013
16 de setembro de 2013
diogo
O Diogo já vivia em mim há mais de oito meses, já o sentia a mexer há cinco, já me conhecia as rotinas, os gestos, e eu os dele. Já éramos cúmplices antes de ele nascer, já gostava dele, muito. Mas quando ele veio para os nossos braços foi como se uma onda do mar me engolisse e me levasse num turbilhão para o que de mais profundo e animal existe em mim. E estar num quarto, numa casa, num planeta onde o Diogo existe é como se uma orquestra tocasse permanentemente uma sinfonia tão bonita quanto ensurdecedora, que não me deixa pensar, que faz de mim um bicho todo irracional, todo instinto. O méu cérebro fundiu-se com o meu útero, o meu coração, as minhas entranhas, e eu deixo-me embalar nas profundezas deste estado em que nem respirar parece ser preciso.
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